Era uma vez a jovem Estrella. Ela era amada incondicionalmente pela mãe e cheia de sonhos e expectativas para o futuro. Esse, no entanto, não é um conto de fadas comum, muito menos com um final feliz. Na verdade, Os Tigres Não Têm Medo é uma fábula urbana sombria que explora a inocência do olhar infantil e projeta em seus personagens os fantasmas da violência das drogas no México.
Com a mãe sequestrada e morta, Estrella (Paola Lara) se junta a um pequeno grupo de meninos órfãos que perambulam pelas ruas e acumulam mágoas pelos familiares também ceifados. O líder é Shine (Juan Ramón López), responsável por buscar comida, roupas e um pouquinho de diversão para Pop, Tucsi e Morro (Rodrigo Cortés, Hanssel Casillas e Nery Arredondo, respectivamente). Em uma delicada dinâmica de afeto, a diretora Issa López toma cuidado para não fazer com que o público esqueça o primordial: mesmo debaixo de carcaças de injustiça e revolta, seus protagonistas são crianças e mereciam ser tratados como tal.
Nenhum homem adulto de Os Tigres Não Têm Medo é confiável.Diferente da sensação de segurança que as breves mulheres oferecem – a mãe e a professora de Estrella –, os homens estão sempre em posições crueis de poder, com armas nas mãos e violência nos olhos. Se torna tão estranho avistar alguém mais velho em cena que, quando acontece, ficamos imediatamente em alerta, preparados para o baque inevitável.
O brilhante elenco infantil, por sua vez, nos conduz por essa pequena aventura de realismo mágico com muita destreza e muita ternura, onde o horror só surge em pinceladas para dar forma a essa cidade abandonada de vidas interrompidas. Os mortos se acumulam ao redor de uma contida Estrella, que se percebe assombrada pelo imaginário para processar sua realidade, e que, pelas lentes de López, ganha o direito de sonhar, negado às crianças do lado de fora das telas.
Com a mesma melancolia profunda de filmes como O Orfanato e A Espinha do Diabo, que também tem a infância como ponto de partida, Vuelven, no original, é um filme triste, tristíssimo, que encontra na contação de histórias um mecanismo de defesa e uma forma de sobrevivência. O horror, ele reserva para a realidade.
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