A temporada caridosa de Drag Race tem se provado um exercício em vão de criação de expectativas e aceitação da realidade. Ao longo das semanas que sucederam a premiere dupla, analisada aqui com óculos cor-de-rosa e certo ceticismo, ficou claro o destino do All Stars 9. Pense em todo o drama potencial das Tesouradas e então anule tudo.
Até a oitava semana da competição, nenhum corte foi bem sucedido. Para além da intriga entre Roxxxy Andrews e Angeria Paris VanMichaels, co-protagonistas de uma temporada sem histórias ou arcos, apenas Plastique Tiara e Gottmik conseguiram capturar os holofotes, tanto nas performances, quanto nas passarelas; de longe o coração pulsante deste ano.
Até mesmo a narrativa ao redor de Shannel não ganhar Broches se esvai quando, prestes a quebrar o vidro à moda da season 1, a veterana é “confortada” por RuPaul – pelo menos na versão que foi ao ar. Jorgeous, que capítulos atrás demonstrou o mesmo senso de cansaço e fracasso, também recebeu palmas e abraços. Não existe Drag Race exitoso sem conflito ou tensão.
E uma temporada editada e realizada ignorando qualquer falha ou desvio apenas capa o potencial do reality show. Se o festival de elogios e beijos na bochecha do All Stars 7 já soava fabricado demais, o sentimento atual é elevado ao cubo. Em um grupo de queens notáveis, mas longe da perfeição e do decoro do elenco de Vencedoras, as rachaduras já obstruem o quadro total.
Vanessa Vanjie (que parece ter abandonado o Mateo do nome) até ensaiou uma rusga, quando Carson Kressley sugeriu que seu visual de escorpião-rosa tinha cara de loja de departamento. Mas a montagem apaziguou o clima e seguiu em frente. Decisões controversas não são novidade em Drag Race, mas a escolha de julgar e competir em times ou grupos acaba soando mais favorável e confortável para a equipe de produção e roteiro.
Afinal, dar o Win do Makeover para Vanjie e Roxxxy ajuda na ascensão da veterana, ao passo que, de longe, quem melhor cumpriu a tarefa foi o grupo de Plastique e Jorgeous. Mas nem tudo são ritos de funeral ou motivo de reclamação: unir desafios em prol de dinamismo aponta para uma reinvenção do que esperamos do show.
O desafio dos grupos musicais em mistura ao Makeover não satura os versos e ainda coloca as queens em uma sinuca de bico. O que rendeu resultados tanto positivos (Gottmik e Nina West deram, estranhamente, certo) com alguns negativos (Kim Chi, no Pit Stop, descreveu com precisão a transformação de Angie e Shannel, definindo o produto como “drag australiana”).
No Snatch Game do Amor, que contou com a presença dos solteirões Kevin e David, desviou da tensão ao separar os Liberaces, assim como Nina West surpreendeu os produtores, quando presenteou Roxxxy, e não Shannel, com o broche extra. Talvez essa seja a razão do fracasso da OG em obter sucesso: o pessoal dos bastidores contava com a ajuda de Nina, e não planejou ou mapeou o terreno para um Top 2 de Shannel.
E falando em Top 2, os Lip Syncs do All Stars 9 morreram antes mesmo de nascer. Ou a música antagoniza as protagonistas (Banana para Mik e Nina) ou a queen não se importa em aprender a letra (Plastique coleciona 4 derrotas e até agora não arrecadou um real para sua caridade). Sem falar no festival de aberrações que foi ver West dublando para Anitta e revelando peças e mais peças de qualidade questionável.
Com mais truques na manga do que a temporada original do formato não-eliminatório, RuPaul maneja com graça e muito controle as 8 Rainhas que escolheu a dedo para beneficiar e celebrar. E se são necessários distribuir broches em Mini-Desafios, que seja! Mas melhor ainda seria se os mais difíceis dos challenges rendessem também, à exemplo do Reading, ou do finado, mas nunca esquecido, Show dos Fantoches.
Com mais 4 semanas até a Final, com o prometido formato de Top 3 brigando pela Coroa e pelo cheque de 200 mil dólares, o All Stars 9 parece longe demais do ponto de se redimir. Ao menos os vestidos de Plastique, toda semana com visual de Finale Eleganza Extravaganza, e o senso estético de Gottmik, do gótico ao manifesto trans, fazem valer a jornada semanal.
A estreia das franquias internacionais com apreço (France 3) e promessa (Mexico 2) diminui o alcance do All Stars 9. Uma dúzia de episódios soa como tempo demais. Os desafios se repetem, os padrões estão desenhados nas paredes falsas do Ateliê. Resta encarar o destino e ver se RuPaul vai escolher o passado glorioso ou o presente incontestável para posicionar as joias e o cetro, já que o Hall da Fama nem na abertura aparece mais.
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