Por fora, o jovem Aaron Hernandez tirou a sorte grande na loteria da vida. Carreira de sucesso no futebol americano, uma linda namorada e filha angelical. Por dentro, os problemas da criação violenta, sexualidade reprimida e violência descontrolada falaram mais alto e sentenciaram seu futuro. A primeira temporada de American Sports Story mergulha na vida e nas consequências do atleta.
Embora não seja tangenciada no lado criminal da história, como outras versões das American Stories de Ryan Murphy, a nova minissérie se dedica ao amadurecimento de Aaron em contraponto ao futuro de violência e morte. Josh Rivera (de Amor, Sublime Amor e A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes) entrega a melhor atuação do ano como um brutamontes impedido de performar a liberdade que almeja.
Ele convence como um homem forte, com porte de Electrolux, assim como se emociona nas cenas que troca com Chris (Jake Cannavale), primeiro um massagista do time e depois seu amante em tempos dilatados. A sexualidade permeia a narrativa, assim como os preconceitos que Aaron cresceu escutando e repetindo.
Aaron prova a masculinidade sempre que pode, seja caminhando pelado no vestiário ou torrando cédulas em boates de striptease. As ações não surtem efeito, já que qualquer tentativa de calar o próprio interior apenas tensiona as emoções. Ele reage com raiva e comete atos de indisciplina: atira em dois jovens que estavam mais para lá do que para cá; fuzila, também, à queima roupa contra um amigo barra pesada, papel hipnotizante de Roland Buck III.
Mas o que Aaron precisa fazer para cruzar o limite da lei, e enfim ser pego, sentenciado e punido, é descarregar a raiva e a confusão no pobre Odin Lloyd (J. Alex Brinson), o namorado da cunhada, que idolatrava o jogador e não tinha mal nenhum no coração. Rivera abraça todas as emoções, indo do calmo ao neurótico em questão de segundos. Ao seu lado, a noiva Shayanna (Jaylen Barron) acompanha os picos de adrenalina e permanece ao lado dele.
American Sports Story monta um cabo de guerra cronológico, mostrando a ascensão de Aaron como escada rolante: ele precisa contornar certas questões, como o vício em álcool, drogas e remédios, escondendo dos companheiros de time e da família uma faceta que necessitava de ajuda e cuidado. Também, como o trágico desfecho revela, as condições neurológicas guiaram seu trajeto ao precipício, por mais que a produção nunca apontasse o dedo na cara dos responsáveis.
Entre os mitos da cultura estadunidense, o futebol americano se prova imbatível e constantemente em foco, com os jogadores tornando-se verdadeiros deuses no panteão imaginativo do público. Quando Aaron passou de ídolo a monstro, porém, a sociedade espiou o espetáculo pelo caráter preconceituoso de sua índole, disposta a crucificar um jovem latino e da periferia, banqueteando-se no sangue que antes glorificou.
As criações e produções de Murphy, do caso de OJ Simpson ao recente retrato dos Irmãos Menendez, atestam o circo midiático que tais horrores despertam na audiência. Em American Sports Story, a sobriedade está em foco, premeditando os movimentos de Aaron, que encontra o pico da montanha justamente no elemento que moldou sua persona: a descoberta de que a masculinidade e brutalidade não equiparava-se ao ideal heterossexual que o mundo demandava dele.
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