O ditador ugandense Idi Amin tomou o poder no país por meio do exército: matou, incendiou e tocou o terror, no que ficou conhecido como uma dinastia de medo e escárnio. À certa altura, intitulou-se Rei da Escócia, numa tentativa falha de aproximar os ideias anti-britânicos que tanto ministrava. O filme de 2006, que rendeu um Oscar “suspeito” para Forest Whitaker, usa da situação real e faz dela uma ficção histórica de fôlego.
O protagonista é o doutor Nicholas Garrigan, desiludido pelas expectativas do pai, que se muda, a esmo, para a África, com o intuito de trabalhar nas aldeias e ajudar a população. Quem vive o novato é um sensual e calculista James McAvoy, inebriante no charme juvenil que conquista não apenas a mulherada, mas também o antagonista de Whitaker.
Na única indicação do filme ao Oscar 2007, o ator venceu uma disputa quase que desleal: seu personagem é marcante pelo tom de voz e pela postura, às quais Whitaker modulou usando o Método de Atuação, e fez valer a condição física-facial. Ele sofre de ptose palpebral ou blefaroptose, caracterizada pela disfunção, ou inabilidade do paciente em realizar a abertura da fenda palpebral de maneira normal.
O que poderia ser um impeditivo, na verdade, tornou sua carreira única e seu rosto, inesquecível. Como Amin, o bicho-papão imprevisível na mesma medida que furioso, não foi difícil levar para casa a estatueta dourada. Na ocasião, derrotou Leo DiCaprio (Diamante de Sangue), Ryan Gosling (Half Nelson), Peter O’Toole (Venus) e Will Smith (À Procura da Felicidade).
A “suspeita” pela vitória não advém da qualidade do trabalho, e sim da categorização dele. McAvoy, presente em oitenta por cento do filme, não foi sequer indicado, enquanto Whitaker apareceu na categoria principal. Clássico caso de fraude, quando um artista submete-se na categoria que julga mais fácil de ganhar. Neste caso, porém, ocorreu o raro exemplo de um coadjuvante julgado pelas lentes de protagonista.
Esta sendo sua primeira (e até agora única) lembrança da Academia, não é estranho entender o apelo da performance e do carisma de Whitaker, que coleciona dois prêmios de Cannes, um de atuação na década de oitenta e outro pela carreira. Também não passa despercebido o movimento dos votantes nos anos 2000, que buscaram reconhecer um número vasto de atores negros, até então sub-representados no panteão de campeões.
Em The Last King of Scotland, o fictício médico de McAvoy é engolido pela burocracia e pela militarização do governo ditatorial. Torna-se, a contragosto, confidente e conselheiro do presidente. Pior: envolve-se com uma de suas esposas, em interpretação pequena mas marcante de Kerry Washington, e vive o horror na pele.
Clausura e medo estão despejados nos vinte minutos finais, quando Nicholas é aprisionado pela mesma mão que antes o acariciou. Violência e brutalidade são os ingredientes que Amin usou na população, quando o médico ainda estava no campo dos aliados. Sem a proteção, a tortura não cessa – e resta prezar pelo externo em busca de salvação. Como a História narra, foi exatamente isso que aconteceu.
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