Ted e Joanna vivem um casamento de aparências. Ele trabalha até o canto do galo e pouco se importa de atrasar compromissos ou deixar o jantar esfriar. Ela cuida do pequeno Billy com obrigação no lugar de afeto. A coisa muda quando a mulher deixa a casa e some por meses. Em Kramer vs. Kramer, drama de divórcio que ganhou afeto do Oscar 1980, a história é mais complexa do que parece.
Quem dirige e escreve é Robert Benton, do roteiro de Bonnie e Clyde e Superman, que emprega o naturalismo da rotina nova-iorquina e esculpe um retrato agudo dos papéis de gênero no casamento e na criação dos filhos. Ted (Dustin Hoffman) precisa aprender tudo: a hora de acordar, como fazer a rabanada no café da manhã, as tarefas da escola e até a leitura antes de dormir.

Afazeres que, para qualquer mãe, são lidos como parte do “pacote”. Que mulher é essa que renega o filho e abandona a família? Essa é Joanna (Meryl Streep), alguém severamente deprimida e reprimida, enclausurada nas normas e nas correntes sociais que colocaram-na na pele de alguém que não reconhece.
Baseado no romance de Avery Corman, o filme não escolhe lados, tampouco julga as decisões dos pais. O que se desenrola na hora e quarenta é uma colagem, ao longo dos meses, de como as pessoas se adaptam ao novo comum em suas vidas. O rótulo de filme de tribunal não faz jus ao trabalho de Kramer na tragicomédia do amadurecimento.

As porções passadas no juizado são poucas, e chegam no último ato, quando Joanna retorna e pede a guarda do garoto. Àquela altura, a amizade e a relação de proximidade entre pai e filho perpassa qualquer lembrança ou noção da mãe, que mantém a voz branda e os olhos em estado de choramingo.
Hoffman, quente na indústria desde suas participações em clássicos como A Primeira Noite de um Homem e Todos os Homens do Presidente, quase recusou o papel, já que enfrentava uma separação na vida real. Mas acabou fazendo limonada dos limões disponíveis, e quando subiu ao palco do Oscar, agradeceu pela oportunidade de trabalhar, falou do descontentamento prévio com a Academia e foi aplaudido de pé.

Tamanha dedicação que o ator ajudou em reescritas do roteiro, sugeriu passagens e treinou o improviso com o pequeno Justin Henry, que ouviu as dicas e correu com elas. A cena do sorvete, quando Billy desafia o pai, foi ideia do menino – e Hoffman seguiu a deixa. Pelo papel, Henry tornou-se a pessoa mais jovem indicada a um prêmio de atuação no Oscar, recorde que mantém até os dias atuais.
Mas nem toda experiência real foi benéfica na produção. Hoffman, preocupado com o status de estrela em ascensão de Streep, buscava diminuí-la no set, sussurrando o nome do marido recém-falecido, combinando cenas sem o consentimentos dela (como a briga no bar, quando o copo arremessado era de conhecimento apenas do ator e do diretor de fotografia) e até estapeando a atriz.

Streep, vencedora do Oscar de Atriz Coadjuvante, e na segunda indicação ao prêmio da carreira, declarou que nunca mais quis trabalhar com Dustin, tampouco manteve contato com o astro. Ela também ajudou no texto, sugerindo novas falas e até questionando o diretor quanto às motivações de Joanna. Os atores recusaram créditos no roteiro.
De vilã na história, Joanna passou a habitar a área cinzenta que o drama pedia. Papel de igualdade ao de Ted, acompanhado pela vizinha e amiga confidente Margaret, que também indicou Jane Alexander ao Oscar de Atriz Coadjuvante. Ao todo, foram 9 menções da Academia, que concedeu cinco delas à Kramer vs. Kramer: Melhor Filme, Roteiro Adaptado, Direção, Ator para Hoffman e Atriz Coadjuvante para Streep.
Deixe um comentário