UK vs. the World 2: o pote de bronze no fim do arco-íris

Tia Kofi venceu a temporada, tornando-se a primeira drag inglesa a ganhar um prêmio em dinheiro

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Apesar da dívida de jogo que trouxe ao mundo a franquia versus the World no Reino Unido, a segunda temporada da competição internacional saiu da sombra da estreia polêmica e mostrou o forte potencial dessas iterações “à parte” do mundinho Drag Race. A dívida, é claro, está na obrigatoriedade de popular o elenco com maioria de britânicas. 

Se a temporada 1 trazia um trio de carisma e notoriedade, a 2 buscou um ovo em cada cesta: Gothy Kendoll, a Pork Chop do UK; Tia Kofi, a Baronesa do Básico que transbordava amor e carinho; Choriza May, a salsicha espanhola que se perdeu na Inglaterra; e Jonbers Blonde, a irlandesa que ainda não sabemos como alcançou a Final de sua corrida regular. Era nítido que, pelas cláusulas da BBC, essas queens foram chamadas para cumprir tabela.

Pela primeira vez em uma temporada estilo All Stars, nenhuma das queens havia competido juntas no passado; foram 11 temporadas representadas em tela (Foto: World of Wonder)

Resultado dessa discrepância entre as nativas é a presença de Tia Kofi como única a vencer um Desafio e, invariavelmente, alcançar a Coroa. Sentimento parecido ocorreu com as representações norte-americanas, que encontravam em Mayhem Miller e Scarlet Envy drag queens que estavam competindo pela terceira vez. Miller, que murchou na S10 e jogou a toalha no AS5, não durou aqui, sendo mandada para casa na primeira oportunidade.

E se no All Stars 5 ela merecia o título de first-out, desta vez sua saída contra uma contraída e envergonhada Gothy pareceu prematura. C’est la vie. Scarlet, que começou a S11 com fama de roubada e passou pelo AS6 sem receber suas flores, aterrissa no UK com algo a provar. E ela provou, com passarelas belíssimas e performances diferentes de seu histórico, com uma primeira participação no Snatch Game que fez valer o valor do voo e da hospedagem.

Finalmente teve prêmio em dinheiro no UK: a winner levou para casa a Coroa, o cetro e 50 mil libras (Foto: World of Wonder)

À parte das participações já amplamente conhecidas e expostas, UK vs. the World escala o melhor elenco possível quando vasculha pelas franquias internacionais e pesca de lá pérolas para a audiência e a para a competição. Da esquecida (e provavelmente cancelada) temporada holandesa, retorna Keta Minaj. Intimidada e longe da persona voraz que dominou Holland 2, a drag foi a quarta a sair, em uma decisão matadora de sentimentos, mas coerente com o andamento da season.

Da Nova Zelândia e Austrália, Hannah Conda continuou arrasando na comédia e ainda demonstrou vulnerabilidade e emoção, especialmente nos momentos que discutiu a resposta dos fãs para a sua participação no Down Under 2, temporada magistral para a Hannah competidora, mas desastrosa para a pessoa por trás da maquiagem. Não é surpresa que RuPaul a adora, e este ano ela teve a chance de mostrar novas facetas de sua arte, brilhando como Shirley Temple no Snatch Game e nunca falhando em desfilar seus pequenos e belos modelitos na passarela.

Figurinhas repetidas: entre Manny Pacquiao e Shirley Temple, o Snatch Game contou com 2 das ex-esposas do Rei Henrique VIII da Inglaterra (Foto: World of Wonder)

Da Espanha, a iluminada Arantxa Castilla-La Mancha molhou os pézinhos numa temporada presidida por RuPaul e Michelle, e, por mais que tenha saído prematuramente, causou frenesi nos fãs, que ansiavam pelo retorno da Hannah Montana espanhola. Agora à vontade em toda sua persona in e out of drag, a loira atraiu os holofotes para sua franquia (que ganhou um All Stars próprio, paralelo ao UK), divertindo o Ateliê pelo pouquíssimo tempo que passou ali e conquistando a faixa de Miss Simpatia.

Sobram, então, as duas estrelas da temporada. Da França, La Grande Dame foi o momento fashion do ano. Um sapo abraçado na Torre Eiffel? Claro! A passarela de Rainha Má com uma alienígena que gotejava veneno? Pode mandar! A runway de revelação com um banho de xixi? Sim, por favor. Um Show de Talentos dadaísta com sons, ecos e uma catwalk de morrer? Também quero! Vencendo os dois primeiros episódios, Dada (apelido carinhoso para as amigas) empalideceu um pouco no decorrer da temporada, que focou no humor e no calibre mais ágil das queens que tem o inglês como primeira língua. 

Miss Simpatia: Arantxa ganhou o coração do elenco, dos fãs e levou de volta para a Espanha a faixa de Congeniality do UK vs. the World (Foto: World of Wonder)

E a queen que nos faz lembrar da vida, já que a vida é curta, não poderia ser outra que não Marina Summers. Super estrela das Filipinas, a pequenina botou para quebrar em tudo: no Talent Show, criou um hino dançante. No Baile, costurou um vestido de gala pela primeira vez na vida e o fez com decoro e elegância. No Rusical em homenagem a Six, ela trouxe o sabor e o requinte asiático, enquanto na dança em dupla ela levantou a moral de Hannah e coletou seu terceiro badge na competição.

Balanceada em termos de vitórias em desafios e triunfos no Lip Sync, a temporada chegou ao momento derradeiro com Tia acumulando 4 Wins, Hannah e Marina com 3 e Dada com 2. O torneio de dublagens pela Coroa nivelou o combate, com a disputa entre a filipina e a australiana produzindo o resultado mais chocante da noite. Sem Summers na Dublagem Final, a vitória de qualquer uma de suas competidoras parecia viável. A britânica derrotou a francesa (que brilhou na comédia e fez coro no último Lip Sync), e enfim chegou à glória da Coroa – depois de um beijo na boca, é claro!.

La Grande Dame chegou da França com status de rainha fashion, e saiu da temporada britânica exibindo humor, personalidade e singularidade para dar e vender (Foto: World of Wonder)

Mas nem tudo são flores. Colocar quatro queens da mesma franquia é um movimento embaraçoso, ainda mais levando em conta o desempenho (tanto prévio quanto presente). Alastrar as fronteiras e escalar estrelas da Tailândia e do Canadá é a saída e o futuro. Sem contar, também, as recém-inauguradas temporadas no Brasil, México, Alemanha, Bélgica e todo o talento que pode ser puxado de lá e avantajado no cenário global.

O que essa season do vs. the World demonstrou é o apetite da audiência, e dos jurados, por drags inéditas para eles. A passagem avassaladora de Marina e Dada pelos palcos britânicos trouxe o mesmo raio engarrafado que brilhou as estrelas de Jimbo, Pangina Heals e Janey Jacké na temporada passada. O que também se provou uma barreira é o inglês e a tradução do humor, com destaque negativo para o Snatch Game, que continua provando uma debilidade para as divas estrangeiras. Repensar o formato é fundamental para que o nível não continue tão desigual no futuro.

Fato curioso: Marina venceu as Dublagens contra as três finalistas, rendendo a ela seu trio de broches dourados (Foto: World of Wonder)

Também negativo na lousa que ilustra o melhor e o pior da competição, o desafio que envolvia turismo e comédia foi um desastre pela falta de direção e comando, tornando-se uma muleta para a eventual eliminação de Keta. Por outro lado, a passarela das redenções transbordou deleite e qualidade artística. Tia Kofi refez o look pré-histórico que a eliminou, enquanto Marina melhorou um vestido que já era bárbaro e La Grande Dame extrapolou criatividade e mão de obra na criação da camisinha ambulante mais fashion da atualidade.

Na Final, os produtores apostaram no formato de Reencontro para espremer o máximo de um elenco com muito a oferecer. Drama por escolha de batons e uma animosidade britânica que envolvia até relacionamentos passados, o momento foi comandado apenas por Michelle Visage, provando sua capacidade ímpar para presidir o painel da 4ª temporada do Down Under. RuPaul, que aqui só apareceu na parcela da passarela do capítulo, mostrou o amor pelas drags.

Nem o ouro de Marina, nem a prata de Dada: a vitória de Tia Kofi foi mais como encontrar um pote de bronze no fim do arco-íris (Foto: World of Wonder)

No já esperado bate-papo antes das decisões, Mama Ru agradeceu e enalteceu suas filhas internacionais. O elenco, bem escolhido e cheio de drags diversas em talentos e habilidades, produziu um dos melhores All Stars da franquia. E quando investigamos a razão para tal, a solução é simples: as 11 competidoras, e em especial o Top 4, se divertiram na frente das câmeras, compartilhando seus ganhos, perdas, medos e alegrias. 

Por isso, não é estranho imaginar um futuro à moda de Jimbo para queens como Dada e Marina, beldades importadas que fizeram RuPaul brilhar os olhos para a arte drag e para o formato de seu próprio reality. As duas, cortadas do Lip Sync Final, saíram do palco sem a Coroa, mas com todo o amor e o prestígio propiciados pela dona do império. Hannah Conda, que viu o brilho do prêmio à curto alcance pela segunda vez, também finalizou esse ciclo com mais prós do que contras.

Ao som de Kylie Minogue, La Grande Dame não hesitou em ajudar sua amiga e cara-metade Tia Kofi nos versos em francês do Lip Sync Final (Foto: World of Wonder)

Na passagem do bastão, Blu Hydrangea se surpreendeu com a existência do prêmio em dinheiro, e só fez lembrar o amargor de sua vitória na temporada que inaugurou o formato internacional. Naquela disputa, sem Jimbo ou Pangina, a irlandesa ganhou um osso da produção, que aproveitou para colocar uma queen nativa no topo. Desta vez, embora seja enfadonho e um tanto desmotivador ver outra inglesa saindo por cima em seu país natal, Tia Kofi fez o que Blu não conseguiu.

Ela venceu 4 desafios, teve momentos de brilho, de comédia e de conexão com as suas irmãs. Sem medo de soar competitiva e muito mais leve no ambiente, Tia carimbou as credenciais de evolução na estética, mantendo a personalidade cativante e sem igual, com direito à passarela em homenagem à falecida Cherry Valentine. Vemos isso em cada ação e movimento até o pódio: das inúmeras tiradas que referenciam o passado, até a comédia em meio aos Lip Syncs e as relações criadas no Ateliê, Tia Kofi aproveitou a jornada e saiu da aventura feliz da vida. 

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