Vencedores do Oscar | O Pianista (2002)

A vitória de Adrien Brody, o Melhor Ator do Oscar 2003, foi surpreendente até para ele

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A história de O Pianista, que segue a vida de Wladyslaw Szpilman (Adrien Brody) durante a 2ª Guerra Mundial, se mistura à do diretor Roman Polanski. O cineasta de origem franco-polonesa experienciou o Holocausto, tal como seu protagonista. Por isso, é nítido o tamanho da dor impressa em cada cena e cada diálogo da obra, adaptada do romance escrito pelo próprio sobrevivente.

Szpilman morreu em 2000, quando o filme estava em pré-produção. O período, marcado por intensos testes e audições em busca do papel principal, encontrou Polanski desiludido e receoso. Sua primeira opção, Joseph Fiennes, estava ocupado demais com o Teatro e recusou a oferta. Apareceu o novato Adrien Brody, que viria a se tornar o homem mais jovem a vencer o Oscar de Melhor Ator, com apenas 29 anos.

O BAFTA foi para Day-Lewis, o Globo de Ouro para Nicholson e o SAG optou por premiar Johnny Depp, por Piratas do Caribe (Foto: Universal Studios)

A Academia, que tem a predileção de premiar atrizes jovens e atores velhos, escolheu Brody em uma disputa surpreendente. Seus maiores concorrentes eram Jack Nicholson e Daniel Day-Lewis, que dividiram os prêmios precursores. Brody venceu o Oscar sem o apoio do Sindicato dos Atores ou do BAFTA, no que se provou uma manobra de amor dos votantes para o filme de Polanski, reconhecido também em Melhor Direção, e Roteiro Adaptado, para Ronald Harwood.

O discurso de Brody, surpreso com o reconhecimento, foi marcado pelo beijo roubado em Halle Berry, que lhe entregou a estatueta. Polanski, por outro lado, não estava presente na cerimônia, já que tinha (e ainda tem) uma ordem de prisão em vários países. Nos anos 70, foi acusado e condenado de abuso sexual contra Samantha Gailey, à época com 13 anos de idade. O Pianista foi o último e único reconhecimento do diretor no Oscar, mas seu trabalho continuou sendo pauta na Europa, onde venceu um César e causou um dos momentos mais marcantes da cerimônia.

Harrison Ford recebeu o prêmio em nome de Polanski, e entregou para ele alguns meses depois, no Festival de Deauville, na França (Foto: Reprodução)

Diretor de obras seminais do século XX, Polanski moldou o cinema de horror com O Bebê de Rosemary e depois brincou de mafioso em Chinatown. O Pianista rendeu uma Palma de Ouro em Cannes, onde a jornada biográfica do músico sobrevivente do regime nazista começou, emocionando e chocando a audiência. O filme foi gravado em ordem contrária, já que Brody precisou perder muitos quilos, e só depois foi ganhando-os de volta, para viver Szpilman nos anos anteriores ao regime de Hitler.

Quando o conhecemos, o pianista está tocando melodias suaves na rádio polonesa, na capital Varsóvia, cenário que ganha contornos de terror ao longo do tempo e da destruição. A apresentação é bruscamente interrompida com bombas estourando vidros e paredes. O homem foge, chega em casa e encontra a família em estado de alerta. A mãe e o pai compartilham o temor, enquanto as irmãs não entendem a magnitude do que está por vir. O irmão é o único lúcido ali, ciente do cenário que se forma.

O Pianista venceu a Palma de Ouro em Cannes (Foto: Universal Studios)

Assim, Polanski dirige O Pianista sem grandes malabarismos estéticos, capturando os pequenos vestígios que crescem e extrapolam o limite ético e humano. Em cenas cotidianas, os nazistas aumentam seu poderio e manejam os judeus para lá e para cá. O “gueto” é o cenário principal da história, que não poupa crueldade e frieza. Brody passa de desacreditado a destruído, e assiste com culpa os eventos.

Único sobrevivente da família, ele acaba isolado. Entre os escombros, vive escondido, faminto, com frio. O ator revelou que, mergulhado no Método, se desconectou de tudo ao seu redor: jogou fora o celular, vendeu o carro, mudou-se de casa, parou de comer. Queria sentir na pele a desumanização do personagem. Contou também que demorou a se ligar de novo no mundo, em um lento processo de reaproximação dos bens após as gravações se encerrarem.

O Pianista é o primeiro filme a vencer o prêmio principal do César, o Oscar da França, sem ao menos uma única palavra dita na língua (Foto: Universal Studios)

A fotografia de Pawel Edelman reflete o estado mental do personagem, perdendo cor e saturação com base no isolamento e na desilusão de Szpilman. O começo, marcado pelo marrom dos móveis e pelo vermelho da família, vai ficando claro e opaco. Ao fim, em meio a neve que chega junto dos russos e da derrota da Alemanha, O Pianista empalidece e quase morre.

A música, que aqui ganha as composições de Wojciech Kilar, tem papel de vilã, já que o silêncio era regra maior em busca da sobrevivência. Szpilman burla o sistema quando, sem emitir uma só nota, imita os movimentos manuais, tocando o piano no ar. Do lado de fora da tela, ouvimos a bela melodia, que pode ter sido o escape do homem, em estado avançado de vulnerabilidade.

Brody aprendeu a tocar piano para o filme, e se desfaz em cena no momento em que pode encostar no instrumento novamente. Sob a vigília de um soldado alemão com mais culpa do que ódio, o personagem tem a chance de desenferrujar, e ganha até um nariz laranja, aquecido pela Música e pelas memórias, em volta de um cenário de gelo e morte. São duas horas e meia de massacre, físico e moral, para que a trombeta soe o hino polonês e a liberdade volte a reinar. 

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