Os Maus Patriotas aposta as fichas no diálogo

Diretor britânico-brasileiro debate liberdade da imprensa ao lado de dois nomes da luta artística e social

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Filmado em apenas um dia, Os Maus Patriotas é simples apenas no papel: o cineasta Victor Fraga, baiano que mora em Londres desde o início da vida adulta, segue o documentário que investigou o Impeachment de Dilma com uma visão mais globalista do avanço da extrema-direita e da desinformação. De passagem na seção Competição Novos Diretores da Mostra de SP, os personagens do título são velhos conhecidos, Ken Loach e Jeremy Corbyn.

O primeiro é diretor de Cinema, que já comandou mais de sessenta filmes e, perto de completar 90 anos, é o único britânico dono de duas Palmas de Ouro, a honraria máxima do Festival de Cannes. O segundo é parlamentar no Reino Unido desde o início dos anos 80, foi líder do Partido Trabalhista e da oposição na Câmara dos Comuns, entre 2015 e 2020, destacando-se por suas posições contrárias à guerra e na defesa dos direitos humanos.

Ken Loach, que venceu a Palma com Ventos da Liberdade e Eu, Daniel Blake, revela que seus filmes, pelo caráter político, fazem mais sucesso na Europa do que nos Estados Unidos (Foto: Victor Fraga)

De cara, é possível entender o papel de cada um dos homens, em seus respectivos campos, para o discurso que carregam e defendem. No filme, o diretor, que também escreve e produz, usa uma narração de espalhafatosa carga de ira para ler comentários e manchetes sobre Loach e Corbyn, rotulados como terroristas, traidores e tudo que há de pior e mais mentiroso.

Na montagem, Valnei Nunes (co-diretor do filme anterior de Fraga), mescla cenas dos longas de Ken Loach, ilustrando com clareza as intenções do cineasta e os motivos de sua perseguição. A mídia não é poupada, já que os homens memorizam os incidentes, ataques e descaso governamental e público que sofreram por defenderem causas sociais. 

Victor Fraga é britânico-brasileiro e fala, especialmente, de como a política é moldada pela mídia e pela força dos veículos de informação (Foto: Victor Fraga)

Loach é lúcido, igualmente, no presente. Reconhece que a defesa da Palestina é um impeditivo para que suas produções sejam bem-recebidas na América do Norte, por exemplo. O documentário foi gravado antes do ataque de outubro de 2023 – desde então, o conflito em Gaza ganhou os noticiários, mas não foi apartado ou combatido.

Amarrando o fio de Os Maus Patriotas com a narrativa de A Fantástica Fábrica de Golpes, o filme de Fraga é desnudo e direto. Cenas de bastidores, como de um microfone que descarrega, estão imersas na densa conversa entre os três. Os assuntos, por outro lado, estão longe de serem de fácil digestão ou resolução. Quando a câmera para de filmar, os problemas continuam do lado de fora, impactando a vida de todos os que Loach, Corbyn e Fraga buscam representar, seja na arte, seja na política. 

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