Goiás nunca foi tão árido e solitário quanto o vemos na captura de Érico Rassi no faroeste (ou centroestern) Oeste Outra Vez. O céu, rasgado por nuvens de cores macias, é sobreposto aos retorcidos troncos de árvores e casas de cimento caindo aos pedaços. Também na figura, embora nunca no centro da reprodução, estão os homens; deixados para trás e à mercê.
As mulheres, como o texto rapidamente dá conta de sanar dúvidas, debandaram-se para lá da linha do trem e do rio, abandonando o dia a dia de violência e repressão. Uma delas, inclusive, aparece na cena de abertura só para abrir a porta da caminhonete e picar a mula. Nos volantes, dois brucutus batalham como em justas medievais.

No lugar dos cavalos ferozes, a lataria gasta dá conta de inspirar o heroísmo autoinduzido e inflamado. Tudo está passado do ponto: as frutas não florescem, a água é turva e até a tecnologia insiste em falhar. Os dissidentes olham para a tela estática do telefone celular, relendo mensagens, fotos ou o que quer que seja.
Certo é que, ali, o tempo parou. No silêncio, a conversa morre pouco depois de ser iniciada, com chiados e gestos sutis com a cabeça; ninguém sabe o que fazer nem como remediar a situação. Afinal, a violência causou a epidemia sem precedentes da solidão masculina de Oeste Outra Vez, um filme de trato dramático humanista e bronco. A rouquidão do discurso é elevada pelos aparatos técnicos, partindo da Fotografia de André Carvalheira.

Repare como a penumbra é assaltada pelas cores e sons das espingardas, que iluminam o breu com o canudo de fogo, endereçando a dor e a mácula aos alvos fáceis, eles também vulneráveis no arredor distópico. A todo momento, o som estoura os tímpanos e violenta audiência e personagens, no que Rassi decupa com ciência de cada plano e contraplano.
Para uma cena que busca mitificar um dos protagonistas, a montagem de Rassi e Leopoldo Nakata nega tal discurso, posicionando a câmera nas esquinas, e a luz longe do semblante. O ermitão (Antônio Pitanga) é visto mais como estátua do que como homem, na sôfrega rotina de beber a mesma cachaça ardente, noite após noite, mentindo sobre a morte da esposa e envergonhado demais para admitir o comportamento que exilou-o.

Os acordos, firmados em ações não-verbais, visam violentar e machucar mais. Do lado de cá, Ângelo Antônio e Rodger Rogério querem o amor de volta; no de lá, Babu Santana, firma-se ciente de que a única resposta a altura é uma saraivada mortal de balas e sangue. Entre os blefes, a voz de Nelson Ned é arauto de um tempo de perdição, onde o estado imaterial das coisas continuará sua lenta e estafante morte.
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