Celestina & Lawrence limpa o céu, mas não encontra o Sol

No Foco Índia da 48ª Mostra de SP, drama de Vikram Kumar explora a miséria emocional

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Quando Celestina (Ankita Kerketta) e Lawrence (Salib Minj) se encontram, a vida não anda boa para nenhum deles. Ela é mãe solo, enfrenta a raiva do ex-parceiro e cai na armadilha armada pelos cúmplices do homem. Ele perdeu o emprego como construtor, foi chutado pela namorada a quem pagou a faculdade e agora precisa se contentar com o salário de vigia noturno numa obra do estado de Jharkhand, na Índia.

O tal encontro, ocorrido justamente quando Celestina, com a filha pequena no colo, vai trabalhar na obra que Lawrence vigia, é o nascimento de uma amizade improvável. O diretor, roteirista e fotógrafo Vikram Kumar estreia no comando de longa-metragens induzindo quem assiste a adentrar o ambiente arenoso e nublado da vida dos personagens.

Em 2014, o cineasta dirigiu o curta documental The Mountain Weavers; Celestina & Lawrence é sua estreia na ficção (Foto: Film Roots)

Celestina & Lawrence, integrante da Competição Novos Diretores e do Foco Índia da 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, é um filme de lapsos emocionais. A violência, velada e explícita, acontece à plena vista, com a mulher subjulgada pelo homem que a engravdou e recusando-se a arcar com os custos, torna-se vítima de uma emboscada policial, que liga ela ao tráfico humano que o ex-namorado é comandante.

Lawrence, na mesma medida, sofre com a institucionalização da mão de obra, e também com as burocracias que impedem-no de trabalhar como construtor na cidade grande. Nem a vila em que cresceu ele visita com frequência, já que o pai, idoso e preso nos ideais arcaicos de masculinidade, é mais peso do que carinho para o filho. E o irmão caçula, nem se fala, com sua rotina de caçar ratos e comê-los com os amigos.

A trilha sonora desempenha papel de máxima importância, no traquejo imperfeito da vida dos protagonistas (Foto: Film Roots)

Não há sequer um fio de leveza na vida ou na mente dos personagens, que enxergam e lidam com a própria desgraça na chave melodiosa da tristeza e da desilusão. O que Kumar consegue emular, no exercício naturalista de longas caminhadas e pedaços de reflexão intimistas, é o estado de apatia que cai por aqueles que não encontram caminho para algo a mais. Celestina e Lawrence podem até negar o presente, mas não conseguem ignorar o terremoto que desestabiliza até o mais forte deles. 

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