A Alegria é a Prova dos Nove: muita forma para quase nenhum conteúdo

Retorno de Helena Ignez é marcado pelas experimentações de imagem e som

min de leitura

Realidade ou ficão?, é o que se pergunta o espectador desavisado de A Alegria é a Prova dos Nove, retorno de Helena Ignez ao posto de diretora. No auge dos 82 anos, a musa do Cinema marginal comemorou nos últimos meses uma porção de vezes, entre elas a abertura da sala em sua homenagem no Belas Artes e uma mostra que relembrava os grandes clássicos da carreira, em sua maioria ao lado do ex-parceiro Rogério Sganzerla.

Na praia, o mar é o canal de tráfego de Ignez ao lado de Ney Matogrosso, interpretando versões alternativas deles mesmos. Ela é Jarda Ícone, sexóloga, difusora do amor livre e do orgasmo feminino. Ele é Lírio, ativista dos direitos humanos que dividiu décadas de curtição e diversão com a mulher.

Agora, na terceira idade, resta a memória. Mas não apenas ela. Através de capítulos nomeados sem ligação entre si, e uma avantajada seleção de gêneros e formatos narrativos, o filme perpassa uma porção de pontos centrais: a opressão da ditadura, as dificuldades da vida da mulher, a questão de gênero e sexualidade, o amor em exercício de liberdade.

A Alegria é a Prova dos Nove fez parte da seleção da 47ª Mostra de SP, em 2023 e se inspira nas carreiras de Oswald de Andrade e Agnés Varda (Foto: Mercúrio Produções)

São focos de ação e drama capitaneados não só por Ignez, mas por um elenco majoritariamente feminino que brinca de estereótipos e de acidez crítica. Até questões atuais, como o conflito Israel e Palestina, estão envolvidos na trama das amigas de Jarda. Uma trupe de muito privilégio e, aparentemente, pouco senso de realidade.

O texto, também da autoria da diretora, extrapola a cerca que divide o teatro do cinema, praticamente recriando cenas de palco, longos monólogos e aquele ar pueril da juventude setentista. Sobra espaço para exagero e escrutínio, enquanto quem assiste se vê refém de uma fragmentação visual. 

A Alegria é a Prova dos Nove prova-se mais como um exercício de criação e libertação de demônios e anjos de Ignez do que apenas mais um filme de sua estrelada carreira. Desta vez, abre mão do discurso direto para papear em diversas rodas de conversa: fala um pouco aqui, caminha até ali, se pinta de azul e louva aos céus. Pena que quase ninguém chegou ao evento sabendo do convite, e no fim é tudo uma grande e decepcionante surpresa. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *