Como nenhuma de suas contemporâneas, Girls sempre protestou a favor dos momentos empacados da vida. Aqueles bolsões de tempo que congelam esperanças e adormecem qualquer ambição, muito comuns na transição da vida universitária para a degradante realidade adulta. Na 4ª temporada, depois de muito apanhar, os personagens chegam a epifanias que prometem romper o invólucro que mantém intacto o futuro.
Hannah (Lena Dunham) se muda para Iowa, onde integra o programa de pós-graduação em escrita. O ambiente é composto por figuras que rejeitam a “sinceridade” da protagonista, encurralada pelas próprias ações. O elenco escalado para popular o curso é ótimo na resposta ao ácido ar de Hannah: Desiree Akhavan (cineasta por trás de Cameron Post), Ato Essandoh (A Diplomata), Marin Ireland (Amores Materialistas) e Zuzanna Szadkowski (Gossip Girl) cutucam e irritam a nova-iorquina.

Elijah Krantz: “Acabei percebendo que fiquei tão bom em tirar selfie que já nem tinha mais graça. Aí pensei: ‘E se eu virasse a câmera pro outro lado?’”
Nem a presença de Elijah (Andrew Rannells), em fuga do lado grotesco da cidade grande, apazigua o espírito da escritora. A única saída é debandar-se de volta para o teto que divide com Adam (Adam Driver). Problema: ao chegar lá, Hannah dá de cara com Mimi-Rose Howard (Gillian Jacobs), nova namorada de seu atual namorado.
A reação é abrupta e paralisa Hannah, que no ótimo Sit-In, quinto episódio da temporada, recebe a visita de todos os amigos, cada qual ajudando a sua maneira na impossível situação que se encontra. A quebra de confiança entre o casal marca a primeira vez que o laço afetivo é rompido de maneira tão violenta e inesperada, o que se reflete na interpretação corpórea que Dunham dá a personagem, em contraste ao lado ególatra de Driver.

Toda a situação que envolve Mimi-Rose escalona no lado de lá da balança, especialmente quando Adam descobre não conhecer por completo a nova companheira. Jacobs, já versada em seus anos de comédia em Community, encarna uma etérea artista que rejeita rótulos e prefere tomar decisões sozinha a ser convencida do contrário. Entre pancadas e a ciência de que a realidade é menos colorida que a imaginação, Adam deixa Mimi-Rose na companhia de Ace (Zachary Quinto), um excêntrico figurão que se envolveu com Jessa (Jemima Kirke).
A britânica ganha mais fibra na temporada, embora o roteiro de Girls continue a recusa em desenvolvê-la para além dos arquétipos de viciada e espontânea. Ela começa o quarto ano se despedindo da idosa que quase ajudou a se suicidar – e leva uma dura da filha da mulher, papel-relâmpago de Natasha Lyonne. Os acontecimentos seguintes jogam Jessa para lá e para cá, até que uma prisão por urinar em público coloque ela e Adam em apuros. Mais tarde, a ajuda no parto de Caroline (Gaby Hoffmann) indica um futuro menos nebuloso para Jessa.

Shoshanna (Zosia Mamet) é quem mais sofre com as recusas do mundo; a pressão dos pais, em participação especial de Anthony Edwards e Ana Gasteyer, se juntam às entrevistas de emprego que continuam retornando em negativas, colocando-a numa energia de cansaço e derrota. Sorte que Ray (Alex Karpovsky), insatisfeito com o novo semáforo que transformou seu quarteirão num inferno de buzinas, decide se candidatar ao conselho público e necessita da ajuda da ex-namorada na empreitada política.
Mas nem tudo é terrível para Shosh, que conhece Scott (Jason Ritter), péssimo como possível empregador, mas um paquera de respeito. Quase ao mesmo tempo, chega uma oferta de emprego no Japão, vendido pela performance ocasionalmente maluca de Aidy Bryant. Se Jessa enxerga futuro na profissão terapêutica, Shoshanna decide mudar de continente e ver o que sairá disso.

Então, chegamos em Marnie (Allisson Williams), o projeto de Taylor Swift que Girls tritura até decantar o brilho vazio no olhar de alguém destruída mas impedida de admitir tal derrota. O namoro com Desi (Ebon Moss-Bachrach) logo se transmuta num noivado, anunciado, é claro, na pior das ocasiões. Ray, ainda machucado pelo término com a cantora, parabeniza o casal, mas sofre com todos os sentimentos aglutinados pela culpa e pelo ciúmes.
O barista não aguenta, porém, ao dizer na cara de Desi o tamanho do babaca que o motoqueiro se mostra ser. Do susto, Marnie acaba sozinha no show organizado pelo chefe de uma gravadora (papel de Spike Jonze) e precisa soltar a voz sem a presença ou os acordes do amado. Em mais uma das epifanias do quarteto protagonista, Girls coloca a prova a resiliência e o talento de Marnie, no que se traduz numa investida positiva para ela.

Hannah navega em solidão pela nova vida: dividindo o apartamento com Elijah, começa a lecionar como substituta. O resultado, como previsto por qualquer um que conheça a personagem, é um festival de decisões constrangedoras, a começar pela amizade nada apropriada com Cleo (Maude Apatow), jovem aluna com quem combina de furar a língua. A garota sofre com a perfuração só para Hannah dar para trás e deixar a “amiga” na mão.
Mas a grande avalanche de Hannah, após o término com Adam, é a revelação de que seu pai é gay – algo que Elijah jogou na cara dela na primeira temporada. No oitavo episódio, Tad & Loreen & Avi & Shanaz, a diretora Jamie Babbit (de Nunca Fui Santa) visita um jantar entre os Horvath e um casal de amigos de longa data, papéis de Fred Melamed e Jackie Hoffman.

O que começa como a celebração pela promoção de Loreen (Becky Ann Baker), logo assume tons trágicos com a confissão do marido. Hannah precisa que toda situação seja sobre como algo a afeta, e sofre com a nova identidade do pai. Elijah não se importa e despeja a felicidade que Tad (Peter Scolari) escondeu por tantos anos, rendendo jargões gays e uma troca de guarda-roupa perfeita para a ocasião.
Tantos acontecimentos e mudanças chegam ao limite na season finale, Home Birth. Catalisados pela terrível ideia de Caroline e Laird (Jon Glaser) realizarem um parto caseiro sem apoio médico ou profissional, Hannah, Jessa e Adam são os responsáveis por levar a grávida ao hospital e, após a chegada da pequena bebê, recolher os cacos. Entre o riso cansado e as lágrimas de alívio, Girls mostra que nunca é tarde para uma repaginação.

Deixe um comentário