Madeleine à Paris canaliza fé e expressão

Documentário multiplica a essência de Robertinho Chaves, dançarino de cabaret que levou crença e alegria à Paris

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Robertinho Chaves é daqueles protagonistas que não precisam de muito para cativar a audiência. A maquiagem, que cobre o hemisfério norte do rosto, é marcada por traços azuis, brancos e pretos, apenas revelando a arte intrínseca do baiano, residente parisiense há mais de vinte anos. Como aponta o documentário de Liliane Mutti, sua missão foi bem-sucedida.

Madeleine à Paris divide sua metragem entre a França e a Bahia, mais especificamente Santo Amaro, onde Roberto nasceu. Do Brasil, levou a saudade e a esperança de uma vida melhor. Carregou, também, os preceitos do candomblé que agora ganham cor, movimento e euforia nas ruas europeias.

Filme foi exibido na 48ª Mostra de SP e celebra o status de ícone e referência queer do protagonista (Foto: Bretz Filmes)

Personagem-título, a Madeleine é também Madalena, figura controversa da Bíblia e que, pelas palavras dos religiosos entrevistados, ganha camadas quando é justaposta ao que a sociedade da época considerava proibido. Isto é, a expressão feminina como sinônimo de garra e perseverança.

Robertinho encontrou o nó que ata a fé afro-brasileira com a vivência francesa, trazendo o ritual da Lavagem de Madalena para um país conhecido pelas raízes preconceituosas de cunho racial. Só por existir, ele dissolve os limites que colocam em sua rotina. É negro, andrógino, bissexual e artista.

A direção de fotografia, responsabilidade de Daniel Zarvos, caminha pelo interior dos ambientes ocupados por Robertinho, entre igrejas, apartamentos e o salão de cabaré (Foto: Bretz Filmes)

Ele não se define por rótulos nem se limita em caixinhas. Como a Santa, alocada numa das igrejas mais luxuosas do local, que faz frente como ópera e também teatro, Robertinho é figura em plena liberdade. A documentarista, empenhada na escultura de um homem multifacetado e multicultural, faz de seu filme uma coleção de depoimentos e memórias.

Para toda a energia que o dançarino de cabaré canaliza em sua vida diária e coloquial, Madeleine à Paris responde com uma direção tímida. A curta duração, em pouco mais de 75 minutos, atua contra a força do filme, que deixa lacunas espaço-temporais que necessitavam de certa conclusão ou ênfase. Como manifesto que eterniza Robertinho na história de uma sociedade que nega a existência de pessoas negras LGBTQIAPN+, o resultado é mais do que virtuoso. 

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