No antro espaço-temporal em que MaXXXine desenvolve sua história, tudo é performance – e todos querem o papel principal. Do policial que fracassou nos testes de atuação, passando pelo religioso que renega à farsa seu senso de grandeza e chegando à estrela de filmes pornográficos que busca sua grande chance em Hollywood, o local é infestado de impostores, egoístas e malcriados.
São estes os atributos que fazem de Maxine Minx (Mia Goth) a candidata ideal para The Tyrant II, sequência de um horror lançado direto em DVD e que agora ganhará a chance de ser exibido nas telonas. A diretora é casca-grossa, e não aceita menos que cento e dez por cento de entrega dos atores e funcionários do set. Elizabeth Bender (Elizabeth Debicki) não hesita em mergulhar as mãos no sangue falso e lambuzar o rosto de uma de suas joias da juventude.
O que cerca o cotidiano tipicamente angelino de ruas imundas, violência constante e o irreal mundo dos astros é o temor pela vida. O Perseguidor Noturno faz vítimas à torto e à direito, mas Maxine não liga muito. Afinal, ela salvou-se por conta própria, e se tornou a única sobrevivente do massacre na cabana de Pearl. Os eventos de X – A Marca da Morte são mais do que contextuais para a personagem, que vislumbra, em borrões, os traumas daquela noite.
No cenário do Motel Bates, enxerga a idosa que matou espiando pela janela. Quando é colocada na cadeira de maquiagem pela artista de efeitos (Sophie Thatcher), o molde do rosto sufoca para além do medo físico, ocasionando um dos vários momentos de pânico da mulher. É fato que, anos depois e uma nova vida em outra cidade, não foram o bastante para que Maxine superasse seu passado.
Na terceira parte da trilogia, o diretor Ti West busca arredondar as arestas que esculpiu em X e Pearl, filmes-irmãos, lançados quase que juntos, em uma leitura idealizada da fama e do que significa alcançar o próprio destino. Agora, MaXXXine azeda a receita de sucesso na tentativa de recapturar a aura de novidade e originalidade que tomou conta do frenesi de Mia Goth.
O potencial viral dos filmes, que vinha das cores saturadas de Pearl e do status de meme quase-brasileiro da protagonista, se esvaem no pastiche de giallo que West escreve sem tanta precisão. Ele mira nos sucessos italianos de assassinato com sangue cor-de-xarope, ao passo em que homenageia Brian de Palma e todos os vértices que os anos 80 exportaram para o resto do mundo.
O elenco de apoio, fator que sustentou a subversão de expectativas de X, e se mostrou habilmente dedilhado em Pearl, aqui ganha tons de escárnio: o amigo que por acaso é dono da locadora e passa o tempo livre maratonando os títulos que Ti West emula é vivido por Moses Sumney; as colegas do ramo de atuação são papéis de Halsey e Lily Collins, enquanto os policiais ganham vida na pele de Michelle Monaghan e Bobby Cannavale. Ninguém tem fôlego para se destacar.
Do breve ao curtíssimo, suas presenças na tela são esvaziadas pelo senso de desprezo que o filme despeja por Hollywood e a cultura de podridão e má fama que ronda o lugar. Kevin Bacon retorna ao gênero em oposição ao papel que o alçou à fama no Acampamento Silver Lake e Giancarlo Esposito continua sua longa, e aparentemente perene, jornada de interpretar o cara malvado que congela emoções e não dobra-se ao perigo.
Sem a acidez que fez de Pearl um jogo de contrastes atemporais, MaXXXine até que brinca de perversão, especialmente quando se rende ao lado voyeur da coisa toda: algo só é válido e verdadeiro se for filmado, assistido e apreciado à distância. Porém, o que nivela a experiência é a tentativa tola de regurgitar preceitos há muito satirizados e solucionados. O monstro, nascido da citação de Bette Davis que abre o filme, precisava de tempo na incubadora, já que o filme tenta crescer mais do que suas pernas sustentam.
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