Em uma pequena ilha da Escócia, Rona busca dois objetivos. Primeiro, quer se recuperar da década que, em Londres, confraternizou, se meteu em encrenca e afundou no alcoolismo. Segundo, busca entender o compasso da vida atual, como usar o diploma de Biologia e, mais difícil ainda, onde ela se encaixa no mundo interiorano que os pais criaram raízes.
Em The Outrun, Saoirse Ronan encarna uma protagonista geniosa e esquentada, que não deixa pedra sobre pedra nem leva desaforo para casa. No filme da alemã Nora Fingscheidt, a lembrança é tão fragmentada quanto a montagem, que intercala diversas parcelas da vida de Rona, da infância conturbada com um pai (Stephen Dillane) diagnosticado com bipolaridade, passando pela adolescência e ingresso na faculdade.
A atriz, amparada pelo roteiro baseado nas memórias de Amy Liptrot, tem espaço suficiente para emular a raiva e a mágoa acordadas pelo alto teor de álcool no sangue. Ronan, de volta às telas após um breve hiato, embriaga-se na graça que divide com o ex-namorado Daynin (Paapa Essiedu) com a mesma gana que encara a religião da mãe (Saskia Reeves).
The Outrun, na maior essência de drama independente europeu, conjura as belas paisagens marítimas para naufragar a protagonista numa ilha isolada. Primeiro filme gravado na Papa Westray, faz uso precavido da natureza, com inserções de narrações pontuais da protagonista, intercalando sua formação profissional com o momento que vive no cotidiano.
Pelas beiradas, o que fica evidente é o frenesi narrativo da obra, que não cessa o caos ou permite que Ronan construa com postura um arco linear de problemas e resoluções. A decisão de mexer na psique da mulher, enquanto o espectador se adequa aos efeitos aflitivos do vício, funciona como moeda de duas caras.
Por um lado, é visceral no retrato pérfido da doença. Por outro, impossibilita uma experiência gradual de entendimento e acomodação dos sentimentos. Ilesa no processo, Ronan acumulou louros desde o Festival de Sundance, onde The Outrun foi apontado como um dos prematuros candidatos aos prêmios de fim de ano. Chegada essa época, a irlandesa pode voltar às conversas de troféus, já que seu histórico é mais do que positivo.
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