O jornal The Toledo Truth Teller não é o foco da Enervate, que lucra muito mais com a empresa de papel higiênico que divide andar com os repórteres. Na chefia, Ken (Tim Key) responde aos executivos, deixando as publicações na internet a cargo de Esmeralda Grand (Sabrina Impacciatore), excêntrica e desvairada. Quando The Paper começa, a contratação do editor-chefe Ned Sampson (Domhnall Gleeson) muda a hierarquia do negócio.
Criada por Greg Daniels e Michael Koman, a comédia começa com um anúncio: anos depois de seguir os empregados da Dunder Mifflin, a equipe de documentaristas quer mais uma vez camuflar-se no ambiente corporativo. Para o azar deles, a firma de papéis foi comprada e vendida. Saindo de Scranton, na Pensilvânia, e indo para Toledo, em Ohio, a produção acompanha os jornalistas.

Os fãs de The Office que torceram o nariz para a ideia de um derivado podem dormir tranquilos e parar com as caretas, pois The Paper não consegue (e nem tenta) imitar o comportamento de sua inspiração. O elefante na sala é Oscar (Oscar Nuñez), que agora é contador do jornal e não está nada contente em continuar sendo filmado. O contrato assinado em 2005 é vitalício, e o esquentadinho terá de lidar com isso!
Mas ele não se contém, e em pouco tempo já coleciona depoimentos, por mais que a sala de reuniões e a proximidade de Ned causem desconforto e até certo estresse pós-traumático de “um antigo chefe”. Sampson não tem nada de Michael Scott, e foi habilmente descrito como uma espécie de Leslie Knope, a bem-intencionada protagonista de Parks and Rec, num ambiente cheio de mentes avoadas.

Se for preciso definir o Michael da vez, a dupla formada por Esmeralda e Ken é o que chega mais perto – e eles ainda estão longe de tal arquétipo. O que The Paper faz aqui, mais do que The Office fez em seu alvorecer, é tratar de um negócio que parece até obsoleto, o jornal impresso que chega diariamente às bancas. Esmeralda odeia a ideia de não comandar mais a trupe, e até sabota uma ou outra situação para que Ned saia-se mal com o manda-chuva Marv (Allan Havey).
Ela, logo, é conquistada pela atitude proativa e otimista do jovem jornalista, integrando o time de repórteres, críticos e redatores do Toledo Truth Teller, abreviado para TTT. Credibilidade e boa vontade para com o veículo são alguns dos desafios enfrentados pelo time, além dos fundos escassos e uma equipe menos preparada do que Ned gostaria.

Gleeson mergulha de cabeça no papel do chefe, e é acompanhado por figuras particulares e que harmonizam o ambiente. Mare Pritti (Chelsea Frei) tem o Exército no currículo e é o mais próximo que o TTT tem de uma proficiente profissional, embora rixas antigas com um professor de teatro e a suposta identidade assexual atribulada a ela sejam alguns dos momentos que tiram a mulher do sério.
Detrick Moore (Melvin Gregg) se veste como um advogado e tem uma paixão platônica pela colega de trabalho Nicole Lee (Ramona Young), uma tímida e preguiçosa jornalista que pouco alimenta sonhos para o futuro. Adeola Olofin (Gbemisola Ikumelo) é contadora de profissão mas adora trabalhar com a apuração e a descrição dos fatos.
Adam Cooper (Alex Edelman) tem quatro filhos, uma esposa tão jovem quanto ele e usa o trabalho para se distrair da cósmica guerra de fraldas, mamadeiras e roupa suja que impera em casa. Travis (Eric Rahill) pode parecer burro, mas surge com ideias inovadoras (que os funcionários recém-demitidos pelo Itaú poderiam usar com graça), e o veterano Barry (Duane R. Shepard Sr.) confunde um bocado as bolas mas é bem intencionado.

A temporada brinca muito com o significado do jornalismo em tempos de miséria informativa e domínio do click-bait, e o faz com paródias ácidas do público consumidor. Um blog escolar desafia a autoridade de Ned e rende mais aprendizados para a equipe do TTT, enquanto, mais tarde, o editor-chefe troca de funções com Esmeralda e coloca seus funcionários para testar os produtos mais esdrúxulos possíveis, de uma máscara facial que queima até comprimidos de melatonina e uma kombucha que regula o intestino.
Entre a comédia simples e o ato de cair de bunda no chão, The Paper tem muito carinho pelo ato de pesquisar, entender e reportar, a alma do jornalismo. Mesmo no hilário capítulo que acompanha um golpista de internet que tira dinheiro de pessoas ao se passar pelo ator Josh Holloway, a série oferece dignidade às vítimas, especialmente a Esmeralda, que sofre ao descobrir um coração partido e a conta bancária esvaziada.

Numa viagem de estrada até um suposto culto, Ned e Mare ponderam sobre a hierarquia do trabalho, o que leva os personagens, em conjunto, à cerimônia de premiação do estado. Lá, com três indicações ao TTT, a equipe alterna entre celebrações, discursos cheios de ímpeto e a desconfortável sensação de que sentimentos são maiores do que pareciam.
O romance à banho-maria não tenta emular a fórmula que Jim e Pam usufruíram no escritório de Scranton, e já se passaram anos o bastante para que The Office fosse referenciado, imitado e até superado no que diz respeito ao tropos da comédia de situação e do falso-documentário. É ótimo reportar que The Paper vive pelos próprios méritos e erros, do jeito que qualquer série cínica mas otimista deve fazer no canibalizado mercado do streaming. Extra, extra: a segunda temporada já foi confirmada e promete estender os contratos da galera do Toledo Truth Teller.
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