Uma das melhores qualidades de The Umbrella Academy, e o que fazia a comédia voar alto entre as mediocridades do catálogo de originais da Netflix, era sua percepção fora da caixinha. Viagem no tempo, brigas com versões passadas, irmãos em guerra e muitos recomeços na timeline trouxeram a turma até uma quarta temporada diferente do esperado.
Em apenas seis episódios, a criação de Steve Blackman e Jeremy Slater conseguiu sobrevida rara nos terrenos do streaming. Diferente do destino de outras séries, esta recebeu a chance de se despedir dos personagens que tanto encantaram o público, afoito por uma super-família que apagasse a tristeza que os X-Men deixaram nas últimas versões do Cinema.
Agora, os Hargreeves estão à par da pressa, e um salto temporal dá conta de pular arcos que poderiam ser esmiuçados fosse este um ano completo de capítulos. Sem poderes depois de restaurar a realidade, eles vivem vidas civis. Luther (Tom Hopper) dança numa boate decadente; Diego (David Castañeda) virou carteiro; Allison (Emmy Raver-Lampman) faz bicos em comerciais de produtos domésticos, e cuida de Klaus (Robert Sheehan), sóbrio e germofóbico.
Five (Aidan Gallagher) trabalha numa agência de investigação; Ben (Justin H. Min) cumpriu pena e está prestes a ser libertado; e Viktor (Elliot Page) mudou-se para o Canadá, onde administra um bar e coleciona casos com as mulheres da cidade. Lila (Ritu Arya) cuida dos filhos que teve com Diego, e esconde uma vontade absurda de voltar à ativa. Os irmãos se reúnem na ocasião do aniversário de um dos sobrinhos, mas, como sempre, tudo acontece às avessas.
O roteiro corre como água em uma cachoeira, movendo as peças sem medo de apressar a história. Fica claro que, por mais que a Netflix quisesse fechar a fábrica o quanto antes, o carinho – e a audiência – propiciaram essa última dança para os antigos vigilantes. Some isso ao surgimento de uma dupla excêntrica de academicistas: Gene (Nick Offerman) e Jean (Megan Mullally), famintos para concretizar a Purificação.
Em mais um apocalipse que precisa ser impedido, The Umbrella Academy segmenta cada dupla de personagens e entrega a eles pouco a fazer. Luther e Diego batalham com a lembrança do passado, buscando um novo propósito. Alisson e Klaus estão no time da retomada, entendendo como suas origens são fundamentais para quem se tornaram.
Viktor ganha a companhia do pai desta realidade, um Reginald (Colm Feore) igualmente cínico, embora mais solícito que aqueles que criou os filhos. O grosso dramático cai no colo de Five e Lila, que ensaiam um romance estranho-mas-bem-vindo, no labirinto de trilhos e estações de metrô que os aprisiona por anos a esmo. A estrela da season 4, porém, é Ben.
Parte da Sparrow Academy, esse Ben é reclamão, impaciente, e, quando esbarra por acidente em Jennifer (Victoria Sawal), a tragédia é premeditada pelo romance proibido que vivem. A chave para a Purificação está no âmago da garota, que “nasceu” numa lula e foi diretamente responsável pela morte do Número 6 original. Na corrida contra o tempo, e os vários obstáculos triviais, os Hargreeves repetem a parceria – com os xingos, puxões de orelha e cutucadas de praxe.
Com cara de epílogo estendido, a quarta temporada desagradou quem esperava um espetáculo de ação que aconteceu no passado (do amor proibido de Viktor com uma fazendeira, até os clãs inimigos e as guerras nucleares). Mas o que os produtores cozinham para o encerramento é condizente ao caráter abrasivo e contracorrente da criação nas HQs. Eles não são heróis comuns, e não teriam um grande final, chupado do algoritmo vigente, com direito a beijo na mocinha e viveram felizes para sempre. Conhecendo essa família, é certo que as brigas e picuinhas continuarão por muito tempo – até mesmo no jardim.
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