Palm Royale tem Kristen Wiig afinadíssima em metralhadora de boas impressões

Comédia de época imita a falsidade dos ricos e concorre a 11 prêmios no Emmy 2024

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Palm Royale, a comédia de Kristen Wiig que passou silenciosa pela Apple TV+, leva alguns capítulos para engrenar. A sinopse não reinventa a roda, acompanhando Maxine Simmons, uma rainha de concursos de beleza que casou bem e agora busca se enfiar na sociedade luxuosa que habita a Flórida na virada da década de 60. O clube que intitula a série é o habitat das figuras caricatas, que se envolvem em apostas, ameaças e muita chantagem.

Em episódios de uma hora, a criação de Abe Sylvia (Disque Amiga para Matar) primeiro esboça os clichês, para depois desbotá-los em prol de um texto vivaz e motivado a deleitar. Maxine tem cara de pau e jogo de cintura, dobrando as ricaças do local. De Evelyn (Allison Janney), busca a simpatia. De Mary (Julia Duffy), a boa publicidade. E com Dinah (Leslie Bibb), encontra uma porta entreaberta.

Kristen Wiig também concorre como Atriz Convidada, pelo episódio que apresentou na 49ª temporada do Saturday Night Live (Foto: Apple TV+)

O recorte temporal que ombreia hippies, veteranos de guerra e herdeiros mimados possibilita que a série mire em distintos objetivos. Wiig, assinando a produção executiva e acumulando uma porção de indicações ao Emmy, se esbalda na sátira da caipira que caiu de paraquedas no mundo do dinheiro, esforçando um sotaque carregado e a comédia corporal que a alçou ao sucesso nos palcos do Saturday Night Live.

Sua protagonista é uma caixa de Pandora, que revela sentimentos e emoções que, à primeira vista, soam estrangeiras ao histórico de vida de alguém que nasceu no lixo e só conseguiu atenção depois de casar com Douglas. Papel de Josh Lucas, o piloto de avião é picareta e oportunista, sugando os direitos da tia Norma (Carol Burnett), a verdadeira dona dos cheques que são assinados e distribuídos à rodo.

Emmy Tapes escolhidas: Burnett submeteu o episódio 5 (Maxine Shakes the Tree), e Wiig, o décimo (Maxine Throws a Party), quando descobre segredos e se apresenta para toda a elite ver [Foto: Apple TV+]

A idosa sofreu com embolia pulmonar e vegeta na cama do hospital. Lá, Maxine brinca de boneca e empresta os modelitos mais fashion da titia, além de buscar seguir seu legado, planejando onde vai gastar a herança farta de Norma. Só tem um problema: a velha já escreveu o testamento e a bufunfa vai todinha para uma fundação animal. E o barman Robert (Ricky Martin) fará questão de que Maxine não afane a fortuna.

Palm Royale, então, desata a amarrar cada fibra tragicômica, em todas as combinações possíveis: as herdeiras que não suportam uma novata, o imigrante destratado pela elite, as vantagens de manter um affair com o instrutor de tênis e a jornalista que fareja cada dito de Maxine. Em meio ao cotidiano, chega hora de planejar e celebrar o Baile da Praia, evento que Norma organizou por 49 anos.

Bruce Dern faz uma pontinha como o pai do personagem de Laura Dern, e Kaia Gerber interpreta a manicure que se envolve demais na vida dos ricos (Foto: Apple TV+)

Não-verbal e presa a mímicas e poses, a idosa que fez Burnett entrar para os livros de História do Emmy é a parceira ideal para Wiig. As duas, experientes no humor de esquetes, mastigam a sátira que Palm Royale abraça com austeridade e vivacidade. Na órbita, o restante do elenco enriquece as escolhas artísticas, com a paz-e-amor Linda (Laura Dern) fazendo frente às peruas do clube.

Quando engrena a trama, lá pelo terceiro episódio, o motor não cansa: humor e emoção são marca maior da série, que adapta o livro de Juliet McDaniel, ostentando valor de produção congruente à riqueza que apresenta em tela. São vestidos, chapéus, joias, sapatos, tudo de babar. Além dos cenários, decorados ao êxtase, e um brinde para os olhos. O dinheiro da Apple, que agora recalcula a rota a fim de cortar gastos, foi muitíssimo bem gasto em Palm Royale.

Palm Royale acaba em um gancho inescrupuloso, e abre portas para uma segunda temporada que poderá debater o legado dos mais ricos e a libertação queer dos anos 60, algum tempo antes da Revolta de Stonewall (Foto: Apple TV+)

Lisérgica e delirante, a série define temas sociais como força de vontade, debatendo direitos das mulheres, questões de afeto homossexuais e o legado sangrento do governo estadunidense, tudo enquanto faz senhoras se apaixonarem por baleias, astronautas salvarem vítimas no mar e um cafajeste se fingir de príncipe de Luxemburgo. Carregando a excentricidade e o vigor de uma mulher destinada a se sobrepor, Kristen Wiig faz valer a indicação ao Emmy de Atriz – e, num ano de campeãs passadas batalhando pelo troféu, que lindo seria ver a loira de prêmio inédito em braços e sorriso no rosto.

Burnett apareceu na lista de Coadjuvante, que combinou com as lembranças nas categorias técnicas (Design de Produção, Maquiagem, Figurino, Trilha, Abertura e Coreografia), sedimentando as 11 indicações de Palm Royale. Faltou, óbvio, mais espaço, justamente para o time de atores que arrasa; Laura Dern e o papai Bruce, Allison Janney, Ricky Martin, Josh Lucas, Mindy Cohn: jogue um nome para o alto e pegue no ar, essa pessoa merece. 

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