O Banho do Diabo esfria a fogueira

Escolha da Áustria para o Oscar 2025, terror folclórico concentra dor e silêncio

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Na Áustria do século XVII, Agnes (Anja Plaschg) tem pouco a fazer. Ela cuida do gado, ajuda na pesca que gira a economia da pequena aldeia em que vive e logo se casa com Wolf (David Scheid), um sujeito para lá de desinteressado nela. E tudo piora quando, sem vingar um bebê no útero, começa a ver coisas que não estão ali.

Ou talvez estejam… É este o ponto de partida dos diretores e roteiristas de The Devil’s Bath, ou Des Teufels Bad, o horror folclórico que representa a Áustria no Oscar 2025 e passa pela seção Perspectiva Internacional da 48ª Mostra de São Paulo. A ambientação não é nova a Severin Fiala e Veronika Franz, que juntos já deram vazão ao claustrofóbicoO Chalé e ao irreverente Boa Noite, Mamãe.

Exibido na Competição Oficial do Festival de Berlim, o filme saiu com o prêmio de Contribuição Artística, dado ao diretor de fotografia Martin Gschlacht (Foto: Vendetta)

A máxima de sua manufatura artística permanece intocada: isolar para assustar. Neste caso, ancorado no trabalho fenomenal de Plaschg, o filme é sutil e venenoso, colocando Agnes na beira do precipício emocional e depressivo que uma vida de casada, sem amigas ou família por perto, pode explicitar na própria alma.

O diabo vive nos detalhes. E aqui são muitos: a aproximação quase amorosa entre o marido e outro homem da vila; a presença inquietante e corrosiva da sogra, papel de Maria Hofstätter; e até a lancinante aparição de uma boneca de cera que chora à plenos pulmões, enlouquecendo a protagonista.

O diagnóstico de depressão psicótica não passa batido pelo espectador, que é alvejado pelo trabalho fantástico da trilha sonora, assinada pelo própria protagonista, sob o pseudônimo Soap&Skin (Foto: Vendetta)

Nem o veneno de rato que esconde embaixo do travesseiro, nem o dedo decepado que se torna objeto de orações à fertilidade sossegam Agnes, andarilha no labirinto eterno de culpa, resignação e clemência. O Banho do Diabo é um eufemismo para esse torpor emocional, registrado historicamente na Europa medieval, quando, as mulheres suicidas optavam por cometer crimes, serem absolvidas pela Igreja e então executadas.

O ingresso para o paraíso vinha às custas das crianças, vítimas dos mais hediondos atos, para que sua captora fosse então perdoada aos olhos de Deus e, enfim, libertada da nuvem de emoções negativas e cobranças externas. A morte em troca da danação, o mergulho em retorno da queima dos pecados. No filme austríaco, as bruxas não precisam queimar para serem exterminadas.

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