Criatividade é o que não falta na ponta da caneta de Brad Ingelsby, criador de Mare of Easttown que volta ao horário nobre da HBO em outra trama rocambolesca de investigação. A bola da vez é Task, um drama em banho-maria que emparelha os dois lados da lei.
Na frente policial, o agente do FBI Tom Brandis (Mark Ruffalo) está fora de forma. O trabalho na bureau ficou esquecido desde que o filho adolescente empurrou a mãe adotiva da escada e acabou na prisão. Adendo: o passado no clérigo do detetive também ajuda na culpa católica que carrega, encarada entre goles de álcool em todas as noites da semana.

Na frente fora da lei, Task encontra a braveza de Robbie Prendergrast (Tom Pelphrey), que viu o casamento ruir com a esposa mudando-se às escondidas, a família colapsar quando o irmão foi morto e tudo ficar mais difícil ao cuidar dos dois filhos pequenos e da sobrinha Maeve (Emilia Jones).
É fato que, nas tarefas diárias, é a garota quem coloca ordem na confusão, cozinhando, dando banho e questionando os primos quanto aos estudos e aos modos da vida fora da marginalidade. Mas Robbie não é uma espécie de antítese de Tom ou algo do gênero.

Ingelsby, ao lado de David Obzud (que atuou como consultor policial na produção de Mare e agora estreia no roteiro), não busca desenhar alvos em seus personagens falhos. Task leva uma porção de episódios para de fato colocar os homens frente a frente. De cara, o objetivo é outro. Robbie e seu fiel parceiro Cliff (Raúl Castillo, de Looking) usam o emprego na companhia de coleta de lixo para encontrar pontos de venda e distribuição de drogas.
Eles arquitetam roubos estratégicos, realizados após as vendas de grandes figuras. A gangue dos Dark Hearts, a qual o irmão do personagem fazia parte e morreu por conta de questões internas, torna-se um alvo do infortúnio destino. Tiros são disparados e, com perdas para os dois lados, a série arruma coragem para colocar Robbie na guarda do órfão Sam (Ben Lewis Doherty).

Com uma criança envolvida na conspiração criminosa, o FBI delega a Kathleen (Martha Plimpton) uma força-tarefa, chefiada por um incrédulo Tom. No time de desajustados que são chamados às pressas para uma base cheia de teias de aranha e madeira podre, Task distribui papéis suculentos.
Anthony Grasso (Fabien Frankel) é o garoto problema que cresceu inerte no jogo da vida. Elizabeth Stover (Alison Oliver) não chegou aos trinta e já está divorciada, incapaz de delimitar o que é pessoal e o que é profissional. E Aleah Clinton (Thuso Mbedu) está focada em cumprir as metas, por mais que seu passado de violência venha bater na porta quando o perigo se aproxima.

Como Michael Mann decantou na veia artística de Fogo contra Fogo, uma obra seminal da década de 90, Ingelsby não tem pressa ou mostra afobação na maneira que conduz a história. Pistas e descobertas vêm a luz do dia nos momentos mais oportunos e cabíveis, num estudo de personagens comuns em situações que lhes exigem mais do que a carne que carregam.
Task é daquelas produções que classificam o caráter qualitativo e de entretenimento da HBO, uma safra que tornou-se rara nos anos recentes do canal americano. É com frescor e audácia que as ideias do criador ganham forma e, aliadas a um elenco encabeçado pelas melhores performances da carreira de Ruffalo, Pelphrey e Jones, alavancam qualquer um que assista desavisado o novo drama de domingo.

Diferente de Mare, concebida como série limitada, Task estará na competição pelos prêmios de drama na vindoura temporada de premiações. Se Brandis, Maeve ou outro dos sobreviventes do cerco voltarão, é questão para outro momento – e nem o criador tem certeza de tais movimentações.
Recusando a ação e o tiroteio pelo tom de espetáculo ou catarse, a direção – cargo dividido entre Jeremiah Zagar e Salli Richardson-Whitfield –, resolve as pendências dramáticas no calor do momento e deixa que o sétimo e último episódio se besunte na calmaria física e na convulsão emocional que Tom precisa encarar. A cena do depoimento no julgamento do filho é antológica e encapsula, ao lado do desfecho de Maeve, o poder de cura e reconstrução que a alma humana é capaz de canalizar, não importa o tamanho da escuridão que tomou conta do lugar até então.


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