Criado em 1955 pela romancista americana Patricia Highsmith, o vigarista Thomas Ripley tornou-se sinônimo de trapaça e dominação na arte, eternizado nas telas do Cinema e da TV entre as diversas aventuras literárias. Além de adaptações diretas das palavras da escritora, Ripley gerou sósias por todo canto, e em Lurker, um protótipo adentra o mundo das estrelas do pop.
Matthew (Théodore Pellerin) aparenta ser inofensivo, e age com tranquilidade quando o cantor Oliver (Archie Madekwe) entra na loja de roupas que ele trabalha. Papo vai, papo vem, o convite para assistir ao show na boate é seguido por uma proximidade estranha. Não demora para que um não desgrude do outro, mas com intenções nada similares.

Escrito e dirigido por Alex Russell, o filme passou pelos Festivais de Sundance, Berlim, San Sebastián e Londres antes de chegar à 49ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, onde integra a Competição Novos Diretores. Expoente da TV, onde escreveu para The Bear e produziu Beef, Russell estreia nas telonas com um conto de caráter imoral e sem apontar culpa ou redenção.
Matthew, sempre atento aos cantos obscuros da relação que alimenta com Oliver, passa de companhia agradável para peça vital de sua turma, formada pelos pouco funcionais Swett (Zack Fox, de Abbott Elementary) e Bowen (Olawale Onayemi); pelo trabalhador Owen (Daniel Zolghadri) e pela proativa Shai (Havana Rose Liu).

Para achar sua função, ele cria oportunidades que soam óbvias quando saem de sua oratória impecável. Azar de quem cruzar seus planos, e esse papel cai no colo de Jamie (Sunny Suljic), amigo de longa data de Matthew que é jogado embaixo do ônibus para que Oliver pense apenas nele como companheiro de vida.
Embora nunca consume o subtexto queer que impõe nas interações de Oliver e Matthew, Lurker brinca com o status de fama e de prestígio, mostrando os bastidores nefastos de uma indústria cheia de lantejoulas camuflando feridas em pústulas. Matthew documenta a turnê e os ensaios da próxima era musical de Oliver, e transforma a câmera caseira numa arma de manipulação mental.

O diretor, visando o interesse no poder das imagens e no que elas refletem, volta seu olhar para um retrato distorcido do fantoche com seu mestre, a todo momento invertendo as suposições de quem assiste. Patricia Highsmith não imaginava, mas seu Tom Ripley gerou uma porção de hipócritas mal-intencionados que se escondem atrás do arquétipo “talentoso” do personagem para se saírem bem na foto. Matthew, à altura da Pedra de Roseta que o molda, esbanja o sangue ruim que transforma a lábia em maldade.
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