As segundas intenções movem o mundo. Pelo menos, é o que acontece em Garotas Selvagens, onde tudo é perverso, vulgar e cheio de reviravoltas. O thriller erótico de 1998 – lançado apenas alguns anos depois de Instinto Selvagem, que deixou marcas permanentes no subgênero – faz o espectador duvidar de tudo que está a sua frente.
Na trama, Sam Lombardo (Matt Dillon) é professor em uma escola em Blue Bay, nos subúrbios de Miami, e conhecido na comunidade por se dar bem com os jovens. Ele é amigo dos meninos e cobiçado pelas meninas, mas se mantém longe de problemas. Até que Kelly (Denise Richards), sua aluna e filha de uma das mulheres mais ricas da região, decide seduzi-lo.

Lombardo nega até não poder mais, mas, em certo momento, Wild Things começa a deixar de mostrar o que realmente aconteceu. E é nisso que, após um encontro entre os dois, Kelly sai correndo, chorando e com as roupas rasgadas da casa do professor – e o acusa de estupro.
O contexto de Blue Bay começa a dar caras. A menina vem de uma família rica, com uma mãe narcisista que defenderá a filha apenas para proteger a reputação do sobrenome – e seu próprio ego, já que ela mesma já teve um caso com Lombardo e foi dispensada. Já Sam é estimado pela comunidade, mas humilde, sem o cacife necessário para se defender.
Ele também tem uma reputação sólida, nega o acontecido e está decidido a lutar para provar sua inocência. Em meio à investigação e ao processo judicial, a polícia local, formada pela dupla Duquette (Kevin Bacon) e Perez (Daphne Rubin-Vega), começa a trabalhar com a hipótese de que Kelly esteja mentindo. O momento decisivo para ter provas contra Lombardo vem quando Suzie (Neve Campbell), a aluna rebelde que odeia a todos e é rival declarada de Kelly, revela que também sofreu o mesmo nas mãos do professor.

Garotas Selvagens tem mais reviravoltas do que dá para contar em uma mão. A sinopse do filme se desenrola com cautela suficiente para construir um panorama claro de Blue Bay, das relações sociais que pautam a convivência local e qual papel cada morador desempenha ali. Temos a garota rica, a mãe narcisista, a menina rebelde, os policiais dedicados e o professor atencioso. Mas quando essas farsas são desmascaradas e ainda faltam tantos minutos pela frente, o que falta?
Mais farsas. O longa se desdobra a cada nova ação. As relações iniciais não são o que parecem ser. As motivações também não. Nada do que se desenrola à frente dos nossos olhos é completamente verdade, mas uma sequência de ações perversas visando segundas intenções. Todo mundo tem algo a ganhar (e a perder).

Garotas Selvagens faz questão de mostrar que ninguém é flor que se cheire. Em um resumo breve (para não dar spoiler), quando Lombardo consegue um acordo milionário com a família de Kelly, os policiais seguem investigando o caso às escondidas e descobrem uma nova teia de combinados secretos, relacionamentos proibidos e muitas conspirações.
O longa traz Matt Dillon, Neve Campbell e Denise Richards como o trio protagonista, uma escolha acertada para escancarar que nada é o que parece. É fácil olhar para Campbell – que, no ano de lançamento do filme, tinha acabado de estrear em Pânico – e imaginar a mocinha da história. Ou ver Dillon, o galã dos anos 1990, como o bom moço. Pelo contrário: conforme Wild Things se desenrola, deixa claro que as aparências são apenas fachada e os rostinhos conhecidos da época não passam de uma farsa.

Mas o que os move? Cada um deles têm seus próprios motivos, que nunca chegam a ser completamente conhecidos. E quando são, podem ser uma mera mentira para enganar uns aos outros. O que os une é claro: desejo e ganância.
O longa mistura mistério e vulgaridade, suspense e luxúria, com tantos plot twists que as vezes fica a dúvida: será que o diretor está tirando sarro do espectador ou a graça está justamente no exagero? Garotas Selvagens não esconde que quer dar o máximo de voltas possíveis, se desmentindo e mudando de ideia até nos créditos finais, como se ele próprio soubesse das limitações do subgênero e debochasse disso. Se por vezes o vai e volta é cansativo, também é autoconsciente e mantém os olhos fixos na tela.

Todo mundo pode ser corrompido. Mesmo assim, na briga de segundas intenções, quase ninguém leva a melhor. Wild Things cria uma experiência de vai e vem quase satírica em sua conclusão, mas deixa aquela sensação de que cada personagem talvez tenha merecido seu destino. Como se nós mesmos, espectadores, fôssemos corrompidos em escolher acreditar.
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