Virou tradição a fantástica e trabalhosa metamorfose que os atores, tipicamente comediantes, precisam atravessar para serem levados à sério. Especialmente quando séries enormes acabam, e a audiência os enxerga como aquele arquétipo estabelecido. Aconteceu com Steve Carell, de The Office para Foxcatcher; com Jennifer Aniston, de Friends à Cake; e agora está nas mãos de Sofía Vergara.
11 anos na pele da explosiva e encantadora esposa-troféu de Modern Family fizeram-na duvidar da própria capacidade de libertar-se da zona de conforto. A saída está carimbada logo na abertura de Griselda, minissérie original da Netflix feita à perfeição para os moldes da atriz colombiana, que esconde os traços naturais com próteses e maquiagem carregada.
Ela vive Griselda Blanco, La Madrina. A mulher que meteu medo em Pablo Escobar e comandou o mercado da cocaína em Miami durante a década de 70. No time da produção, são quatro os profissionais creditados na criação, e mais dez nos roteiros. Fica óbvio, pela ficha técnica, que Griselda é o mais puro suco do produto idealizado na sala de reuniões, com os acionistas esboçando gráficos de desempenho.
Nela, falta a fagulha de originalidade que Narcos exportou no catálogo do streaming, e estranha que muitos envolvidos na saga de Escobar tocam o barco de Griselda, agraciada, óbvio, com o filtro amarelo-mofado que encapsula qualquer produção passada primeiro na América Latina e depois em lares imigrantes.
Didática e protocolar, a série não se coloca à altura de Vergara, que opta pela grandiosidade e o lado teatral da mulher, mãe de 3 filhos e foragida de um marido mais do que perigoso. Tudo acontece a toque de caixa, com a ascensão e queda de Griselda sendo lida como página de biografia, e distante das possibilidades que o audiovisual permite.
No Emmy 2024, Sofía Vergara disputa o prêmio de Melhor Atriz, e se superar o favoritismo de competidoras com séries mais badaladas, pode seguir o caminho de Halston, também da Netflix, e deixar para trás os erroneamente tidos como favoritos. Griselda ainda concorreu como Melhor Fotografia e Melhor Figurino, mas não teve chance contra a força de Ripleye Feud. No fim, o espetáculo é solo e focado inteiramente na mulher por trás da lenda.
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