Quando sua criação nacional sobre a sede por dinheiro e os custos sangrentos dos bilionários torna-se uma sensação viral, transformando os jogos violentos em marca de venda e a rede de streaming despeja rios de receita e uma proposta irrecusável, não há final otimista ou heroico a ser feito. A terceira e última temporada de Round 6 conversa com o contexto fora da ilha e dos jogadores numerados.
Do sucesso inesperado, o criador Hwang Dong-hyuk já cansou de falar. A primeira temporada rendeu recordes de audiência, cobiçados prêmios da crítica e da Academia de TV, e ainda abriu portas para a dominação asiática que estava sendo cultivada muito antes de Parasita vencer o Oscar e tomar Hollywood de assalto.

A temporada 3, iniciada nos calcanhares do ano anterior, continua a segunda aventura de Gi-Hun nos jogos, desta vez alicerçado no silêncio culposo pela morte do amigo no motim que deu errado. Ciente do desgaste que uma interpretação vocal e estridente poderia desempenhar em quem assiste, Lee Jung-jae passa parte dos seis episódios em estado de dormência sensorial, algemado à cama.
Fundamentando as âncoras emocionais da série nas três mulheres que sobreviveram ao ataque e prosseguem para o Esconde-Esconde na rodada atual, Round 6 decide eliminá-las, em um espelhamento da morte da esperança que permeia a outrora fome de vingança do protagonista.
Assim, mais uma vez equipadas com apetrechos feitos para tornarem-se iconografia da série, as jogadoras 120 (Park Sung-hoon), 222 (Jo Yuri) e 149 (Kang Ae-sim) são obliteradas pelas circunstâncias das facas e das chaves. Mais do que o papel social que carregam, da ex-fuzileira transgênero, a grávida em trabalho de parto e a idosa que sempre protege o filho covarde, as personagens encontram o fim, uma a uma, nas desastrosas decisões dos demais envolvidos.

Quando 222 é forçada a escolher entre a vida da bebê que acabou de parir ou a sua própria, a resposta está intrinsecamente ligada ao lado protetor de 456, que abraça a criança e leva-a ao derradeiro destino planejado pelo Frontman (Lee Byung-hun) e pela presença sempre inquietante e desconfortável dos VIPs, sempre falando um inglês engasgado e artificial.
O melhor trabalho de atuação na leva final está nos ombros e nos olhos de Kang Ae-sim, que decide sacrificar seu mais precioso tesouro para que outros tenham a chance de prosseguir com o deles. É brutal e inesperado, assim como alivia uma migalha da culpa de Gi-Hun, à partir dali um homem renovado no que tange seu propósito na volta aos jogos.

Na hiper masculina presença das “semifinais”, Round 6 abraça a apatia como armadura, numa guerra de egos que desafia os preceitos básicos da humanidade. Ao fim do Jogo da Lula em tamanho aumentado, Gi-Hun entende que a salvação está além do ponto de feitura – a mímica perfeita para o que a série se tornou no âmbito popular.
É golpe baixo a admissão da bebê no jogo, com o mesmo número da mãe que saltou para longe da plataforma a fim de livrá-la do fardo, mas todas as apostas são válidas no último lance de Squid Game, que continua investindo no visual e no desenho de produção, com desafios intrincados, objetos de cena bem bolados e mortes impetuosas.

Para a anticlimática resolução das tramas do detetive (Wi Ha-jun) e da funcionária que se rebela contra o sistema (Park Gyu-young), o roteiro aceita o fardo das mortes, do desgaste e da desesperança. Construindo uma ponte nada sutil para o derivado americano de David Fincher (e aparentemente Cate Blanchett), há algo de maléfico e insosso na maneira que Round 6 pinga seus is e risca seus tês; à moda do espetáculo indevido que fez da série coreana um furdunço social e popular.
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