3 temporadas depois, The Morning Show se torna irresistível

Greta Lee brilha na melhor temporada da série, que disputa 16 prêmios no Emmy 2024

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Um veículo midiático que encontra dificuldades em passar incólume pelas notícias. Foi assim que surgiu The Morning Show, à luz do sem número de denúncias que arremataram Hollywood, e disposta a dissertar sobre abuso no ambiente de trabalho. 4 anos, 3 temporadas e 1 pandemia depois, a série da Apple TV+ finalmente desabrocha em seu total potencial, com espaço para viagem ao espaço.

Séries de TV precisam de tempo para amadurecer, encontrar ritmo e fascinar seu público alvo. O que ocorre aqui, muito carregado pelo período de produção do programa, é a perda do acanhamento em assumir os dramas mais novelescos possíveis, dentro, obviamente, de uma emissora recheada de figuras fascinantes e sedentas pelo horário nobre. Sai de cena toda a trama de Mitch Kessler, enterrado sob a performance deslizante de Steve Carell, e entra no palco o desejado retrato dos bilionários farejando as notícias.

Em The Love Island, 3×05, a série volta para os tempos iniciais da pandemia e revela os percalços individuais, do romance de Laura e Bradley, até a relação de Mia com o fotógrafo de guerra (Foto: Apple TV+)

Rápida recapitulação: durante a pandemia, Alex Levy (Jennifer Aniston) deslanchou com seu programa de entrevistas, foi premiada e saiu da bancada fixa da atração matinal. Bradley Jackson (Reese Witherspoon), jornalista in loco no dia da Insurreição, conquistou prestígio e agora é âncora do noticiáriovespertino. No meio do caminho, entre produtores, diretores e o chefe da UBA, The Morning Show encontra as brechas para se atualizar e modernizar a história.

O magnata e bilionário aeroespacial Paul Marks (Jon Hamm) quer porque quer adquirir a empresa, por uma bagatela de 40 bilhões e o aval de Cory Ellison (Billy Crudup), CEO que finalmente enfrenta um peixe maior que ele mesmo. Na rotação de conversas fiadas e negócios à luz de velas, se envolvem Stella Bak (Greta Lee), a chefe de Jornalismo, e Mia Jordan (Karen Pittman), produtora-chefe do TMS.

Nas atualidades, o roteiro se coloca a frente de momentos gigantes do Jornalismo, como o ataque russo à Mariupol e a decisão envolvendo Roe v. Wade (Foto: Apple TV+)

Recolhendo peças-chave do que fez Successiono xodó de uma audiência de ressaca depois do fim de Game of Thrones, The Morning Show aposta todas as fichas no megalomaníaco jogo dos peões corporativo, deixando que seus personagens, em suma jornalistas, coloquem em xeque a ética e a moral da profissão em prol de benefícios pessoais. 

Caso de Bradley, que encontra em Cory uma viga de sustentação quando precisa encobrir ações do irmão viciado e, para isso, quebra mais leis do que o desejável. Seu relacionamento com Laura Peterson (Julianna Margulies), ocasionalmente atravessado por conflitos de criação e de como lidar com o mundo, chega a um impasse impossível de ser desatado com a facilidade de antes. 

2 vezes vencedora do Emmy por The Good Wife e dona de um troféu por ER, Margulies ficou de fora da edição de 2024, apesar de entregar uma performance sublime como a jornalista Laura Peterson; ela não voltará para a quarta temporada (Foto: Apple TV+)

Lidando com mudanças radicais dentro e fora do estúdio de gravação, o time de executivos precisa encarar um episódio de racismo, descoberto no enorme hackeamento que a rede sofre. Em uma troca de e-mails, a acionista e herdeira Cybil Richards (Holland Taylor) chamou a novata Chris Hunter (Nicole Beharie) de “Tia Jemima”, ocasionando o cerne do episódio 3, White Noise, quando a jornalista entrevista a ricaça em rede nacional.

Tamanha relevância de temas tirados diretamente da mídia, The Morning Show tem chance de escolher quais crimes espelhar na ficção. Stella lida com o preconceito vigente da pandemia, enquanto Mia sente na pele as mazelas de promessas vazias, como a de que a empresa contrataria mais profissionais não-brancos e, para melhorar, pagaria salários justos. O hack, novamente, escancara a realidade desigual.

Homem com H maiusculo, o personagem de Jon Hamm se envolve romanticamente com Alex Levy e precisa aceitar um destino de incomodidades; em 2024, o ator apareceu também na lista de Minissérie, por Fargo (Foto: Apple TV+)

Enquanto Cory continua sua eterna performance de “está tudo bem, vamos todos conseguir”, o ator Billy Crudup – vencedor do Emmy em 2020 -, arrasa no malabarismo emocional. Ele passa de alegre para raivoso e então desiludido num piscar de olhos, engrandecendo um papel que poderia cair na monotonia do chefe inatingível. As cenas trocadas com a mãe, personagem de Lindsay Duncan, figuram na lista do que de melhor o roteiro da terceira temporada reserva. No embalo, Reese Witherspoon compartilha a angústia de Cory e soma à ela a raiva e a decepção de Laura, o amor que sempre está um passo longe demais. 

Com denúncias, fotos de paparazzis, chantagem e a busca pela raíz do mal, a terceira temporada foi enfim abraçada pelo Emmy. A inédita indicação à Melhor Drama chegou junto de um pacote enorme para o elenco: Aniston e Witherspoon em Atriz, Crudup, Hamm e Mark Duplass em Ator Coadjuvante, e o quarteto Greta Lee, Nicole Beharie, Karen Pittman e Holland Taylor em Atriz Coadjuvante. Em Atriz Convidada, Marcia Gay Harden repetiu o feito de 2022.

São 16 indicação ao Emmy 2024, incluindo em Direção para Mimi Leder pela season finale, além de lembranças em Casting, Design de Produção, Figurino e Maquiagem; o time caprichou, especialmente nas luxuosas locações e eventos de gala (Foto: Apple TV+)

Depois de testar suas balas em temporadas irregulares, do escândalo do MeToo da primeira até o tratamento do período pandêmico na segunda, The Morning Show triunfou onde menos esperava: no bate e volta entre a intriga, o sentimentalismo e a perseguição da verdade, com a ajuda de atores do calibre de Stephen Fry, Tig Notaro e Natalie Morales. Os alicerces do fazer jornalístico dispostos como armas numa cornucópia, prontos para serem arremessados, alvejados e até destruídos, seja qual for sua justificativa e conclusão. A mídia que alimenta a própria flagelação, ancorada aos interesses dos mais ricos, que posam sorrindo para as fotos. 

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